Uma gaivota
que alçava altos vôos pelo mundo resolveu pousar, encontrar algo que desse novo
sentido a seu voar. Fazer seu ninho. Procurava um par. Queria prender-se,
apegar-se a algo.
Certo dia,
enquanto buscava alimento, avistou, escondido entre as pedras algo diferente,
suspenso e inerte. Ficou muito tempo
olhando e nenhum movimento acontecia. Sua curiosidade o fez voltar, todos os
dias, para ver o que aconteceria. Aquele
inseto se transformava num casulo, estava sob seus cuidados e sem ele mesmo
dar-se conta foi se tornando o guardião
daquele lugar, sem saber o por que e o que o esperava, ia se apegando àquilo,
e, inexplicavelmente seu afeto e carinho estavam crescendo a cada dia e ele tomou
pra si a obrigação de defendê-lo. Abandonou sua vida de viajante, e, naquela
primavera ficou ali guardando o seu sono.
Numa manhã,
depois de ir alimentar-se, voltou para sua fiel tarefa e surpreendeu-se ao ver o objeto do seu cuidado e zelo. O
processo de sua metamorfose, enfim, estava completa, sua lagarta havia se tornado
uma borboleta. E como era linda,
colorida, alegre. Ela ainda estava um pouco perdida e ele estava encantado com
o que via.
- Bom dia,
minha bela Borboleta!
Ela, que se lembrava dos tempos
de lagarta, sabia que outros daquela espécie já a tinham ameaçado, assustou-se.
-
Calma, não vou te fazer mal algum. Estive aqui a guardar teu sono por todo esse
tempo. Não precisa ter medo.
Ela sentiu segurança em suas
palavras, em seu olhar...
-
Acabo de acordar, me sinto diferente e estranha.
-
É o natural, acaba de nascer novamente.
-
Bem, estou grata, mas preciso ir. Quero testar minhas asas, buscar o néctar das
flores.
-
Posso te acompanhar, são tantos os perigos existentes para alguém novo neste
lugar.
-
Agradeço, mas, acho que não deve prender-se a mim, deve ter sua vida, seus
amigos e precisa ir.
Ela, não sabia que pra ele, ela
já era todas as coisas, tinha preenchido todos os espaços e era o seu lugar.
-
Deixa só te acompanhar...
-
Está bem...
A
gaivota levou a borboleta a lindos lugares, campos floridos de primavera,
levou-a para ver o mar e ao mais alto lugar perto do céu. Quando ela se cansava
se aconchegava em seu dorso e ele a levava para conhecer o mundo e apresentá-lo
enquanto eles se descobriam também. Eles eram felizes juntos, suas diferenças
os completavam.
Um
dia, a precipitação da gaivota fez com que decidisse que já era tempo de
fincar-se em um lugar, formar um ninho e
decidiu que a borboleta seria a companheira ideal, sabia que a amava e que tudo
entre eles era especial. A borboleta,
por sua vez, amava a gaivota, mas, não estava preparada para aquela proposta,
acabara de conhecer o mundo, era jovem demais... Não estava pronta.
A
gaivota preparou-se, tomou banho, se perfumou, colheu flores e mel, fez um novo
canto pra seduzir seu amor.
-
Minha querida tenho um pedido a te fazer...
-
Por favor, me diga
-
Te ofereço o meu amor, o meu ninho, o meu canto e peço que venha comigo
construir nosso amor, buscar o nosso lugar, bater nossas asas mundo a fora juntos
pra sempre.
A borboleta ficou muito
assustada, batia as asas desordenadamente. Sentia um grande amor por ele, mas,
sabia, que ele precisava voar alto e não saberia acompanhá-lo, não queria
perdê-lo, mas, não podia prendê-lo, afinal, era uma simples borboleta e
conhecia suas limitações. Não queria magoá-lo e acabou magoando ainda mais.
Resolveu aceitar, mas, com a secreta intenção de fazê-lo desistir, sabia o
quanto diferente eles eram.
Voaram juntos por mais algum
tempo, até que ele compreendeu que não era ali o lugar do seu ninho e partiu,
no final daquela primavera. Levantou vôo, levando consigo a beleza da borboleta
e deixando com ela o seu canto.
Eles
tinham a mesma natureza: voar, ser livre, sonhar, amar... Jamais se esqueceram,
se buscaram e era fatal que isso os
reaproximariam ao longo da vida. Formaram seus ninhos em terras distantes entre
si, traçaram destinos iguais e paralelos, porém, em direções opostas.
Novas
rotas de vôo, em uma outra primavera os colocaram frente a frente. Claro que se
reconheceram, ela tinha seu canto gravado dentro dela e ele conhecia a essência
de sua alma, seus pensamentos. O amor que um dia tiveram um pelo outro não
havia acabado, só estava em repouso, se fortalecendo – como a metamorfose que a
lagarta sofrera - pra renascer mais
forte. E renasceu, como se tivessem se despedido na noite passada. O tempo não
existiu, a distância não existiu. Os obstáculos, as dificuldades traçadas nos
caminhos percorridos por eles não se
forjaram em argumentos suficientemente fortes pra combater o que sentiam.
Puderam
então, construir juntos seu ninho, voar na mesma direção, se perderem um no
outro e descobrir que só assim encontravam-se. Não puderam resistir, nada foi
mais forte. O amor venceu, a despeito de qualquer situação difícil que tenha
surgido. Formaram seu ninho, num lugar longe dali – a borboleta não se
importava, o seu lugar era ao lado do seu amado, nele ela se completava e era
feliz como nunca. Sabiam que pertenciam um ao outro e juntos eram os seres mais
felizes do mundo. Alçaram novos vôos, e, por onde passavam deixavam seu canto
apaixonado e o perfume suave desse amor.
Trocavam juras eternas sob a luz e a benção do céu azul e contagiavam
pássaros e outros voadores com o rastro de sua
alegria que estavam presentes no ar.
“Nem tempo, nem
distância podem apagar ou macular o verdadeiro amor”.
Marcela Liz